terça-feira, 1 de agosto de 2017

15 FILMES IMPERDÍVEIS (E ESCONDIDOS) NA NETFLIX - PARTE 2

Prosseguindo com a lista de preciosidades que podem ter passado em branco diante da variedade de títulos da Netflix Brasil, o blog apresenta mais oito produções que valem o tempo investido - por diversas razões, que vão desde a história até o elenco, a direção e seu senso de entretenimento. Aproveitem!

08 - EXPRESSO DO AMANHÃ (Snowpiercer, 2013) - Direção: Joon-ho Bong



Em um futuro distópico onde quase toda a vida na Terra foi exterminada pela falha de um experimento climático, os sobreviventes vivem em um trem e são separados por suas classes sociais. Quando uma rebelião explode, o líder Chris Evans e seus apoiadores resolvem exigir igualdade entre todos - o que dá origem a uma viagem repleta de surpresas, um ritmo admirável e um elenco de grandes atores (Tilda Swinton, Ed Harris, John Hurt, Jamie Bell). Um enorme acerto do cineasta sul-coreano conhecido dos cinéfilos mais ecléticos graças ao filme de monstro "O hospedeiro" (2006) e ao denso "Mother - a busca pela verdade" (2009).

09 - GUERREIRO (Warrior, 2011) - Direção: Gavin O'Connor



Joel Edgerton é um professor que precisa ganhar dinheiro para pagar o tratamento da filha pequena. Tom Hardy é um ex-delinquente juvenil que pede a ajuda do pai com problemas com o álcool (Nick Nolte, indicado ao Oscar de coadjuvante) para vencer o campeonato de MMA. Os dois chegam juntos à final - e tem muito mais em comum do que a plateia poderia esperar. O diretor Gavin O'Connor - que dirigiu "O contador", com Ben Affleck, em 2016 - constrói uma narrativa envolvente e emocionante, que pega em cheio até mesmo àqueles que não estão nem aí para o esporte. Foi um dos filmes que empurraram Tom Hardy para o estrelato - e ele não agarrou a oportunidade com unhas e dentes.

10 - INVENCÍVEL (Unbroken, 2015) - Direção: Angelina Jolie



O segundo filme de Angelina Jolie como diretora - o primeiro foi "Na terra de amor e ódio", de 2011 - é um passo à frente em sua carreira atrás das câmeras, que prosseguiu com o drama "À beira-mar", em que atuou ao lado do ex-marido Brad Pitt. "Invencível" é, por enquanto, seu melhor trabalho. Tendo a sorte de contar com um personagem principal quase inacreditável, uma história forte e emocionante (sublinhada por ela com toques de um sutil cristianismo) e profissionais de primeira linha (a fotografia de Roger Deakins, indicada ao Oscar, é espetacular), Jolie demonstra sensibilidade e inteligência acima da média. Baseado em fatos reais, o filme é estrelado pelo jovem Jack O'Connell, que emociona do início ao fim como um atleta que, pego pelos japoneses como prisioneiro da II Guerra Mundial, passa por situações que o forçam a testar sua fé em Deus. Não é um filme religioso, nem uma produção de guerra comum. É apenas um pequeno grande filme.

11 - LOCKE (Locke, 2013) - Direção: Steven Knight



Tom Hardy não é apenas um (bom) ator de filmes de ação. Ele sabe dar vida a tipos mais dramaticamente complexos, como mostra esse angustiante filme do inglês Steven Knight (indicado ao Oscar de roteiro original por "Coisas belas e sujas" em 2004). Sozinho em cena o tempo todo, Hardy interpreta o personagem-título, um homem que está na estrada para acompanhar o parto de uma amante ocasional em outra cidade e, no caminho, precisa resolver problemas profissionais, lidar com o filho que lhe exige atenção, revelar à esposa sua escapulida extraconjugal e tomar as providências necessárias para o parto iminente. Detalhe: ele faz tudo pelo telefone. Parece chato, mas Hardy dá um show e envolve o público em seus dramas sem derramar mais do que algumas furtivas lágrimas. Imperdível!

12 - O PREDESTINADO (Predestination, 2014) - Direção: The Spierig Brothers


Esse fascinante conto de ficção científica - concebido por Robert A. Heinlen - é um típico exemplo de história que, quanto menos se souber melhor. O que dá pra dizer sem estragar nenhuma surpresa é que Ethan Hawke vive um policial que, em uma tentativa de caçar um perigoso criminoso que matou centenas de pessoas, viaja no tempo e dá de cara com uma trama intrincada e quase inacreditável. A atuação corajosa de Hawke, a direção segura dos irmãos Spierig e a revelação da ótima Sarah Snook conseguem o improvável: dar verossimilhança a um jogo de reviravoltas de espantar até ao mais escolado espectador. Uma pérola do gênero!

13 - SETE MINUTOS DEPOIS DA MEIA-NOITE (A monster calls, 2016) - Direção: J.A. Bayona



O espanhol J.A. Bayona já assustou em "O orfanato" (2007) e fez chorar em "O impossível" (2012). Em "Sete minutos depois da meia-noite" ela volta a fazer as duas coisas, mas dessa vez ao mesmo tempo - e baseado em um livro infantojuvenil. O ótimo Lewis MacDougall trabalha como gente grande, interpretando um menino que, para lidar com a grave doença da mãe (Felicity Jones, indicada ao Oscar por "A teoria de tudo"), conta com a ajuda de uma gigantesca e apavorante árvore em forma de monstro que, para lhe ensinar as coisas da vida, inicia uma série de histórias cuja moral o garoto só poderá compreender completamente quando chegar a hora. De emocionar ao mais empedernido ser humano, ainda apresenta efeitos visuais interessantíssimos e a presença de Sigourney Weaver.

14 - SETE PSICOPATAS E UM SHIH TZU (Seven psychopats, 2012) - Direção: Martin McDonagh



Segunda parceria entre o diretor Martin McDonagh e o ator Colin Farrell - a primeira foi com "Na mira do chefe", indicado ao Oscar de roteiro original em 2009. Dessa vez eles vão ainda mais longe na criatividade, misturando metalinguagem, humor negro e sequências de ação que não poupam os clichês do cinemão hollywoodiano. Farrell, brilhante, vive um roteirista que passa por um bloqueio criativo em um filme chamado "Sete psicopatas" e começa a receber a ajuda de um amigo pouco confiável (Sam Rockwell, usando e abusando da cara de louco). Enquanto apresenta os psicopatas criados por Farrell dentro da narrativa, McDonagh conta seus percalços para cumprir sua missão - e mostra personagens bizarros interpretados por gente como Christopher Walken, Woody Harrelson e Harry Dean Stanton. Não é um filme para qualquer público, mas tem momentos de genialidade.

15 - SING STREET (Sing Street, 2016) - Direção: Art Carney



O nome de Art Carney pode ainda não ser popular, mas sua regularidade não deixa de ser impressionante. Depois dos ótimos "Apenas uma vez" (2007) - vencedor do Oscar de melhor canção - e "Mesmo se nada der certo" (2013) - indicado na mesma categoria - ele voltou a encantar com "Sing Street", usando os mesmos ingredientes de seus trabalhos anteriores. Simplicidade, delicadeza, ritmo e diálogos humanos são a matéria-prima de Carney, que conta histórias sobre pessoas comuns e sublinha suas emoções sempre com trilhas sonoras arrebatadoras. Dessa vez, ele volta os olhos (e os ouvidos) para a década de 80, para narrar as aventuras românticas de um adolescente que cria uma banda de rock para conquistar o amor da menina por quem é apaixonado. Sem nenhum astro no elenco - mas uma música-tema cantada por Adam Levine, do Maroon 5 - o diretor cativa pela honestidade e pelo carisma de seus atores novatos. Outra pérola a ser descoberta!

quarta-feira, 26 de julho de 2017

15 FILMES IMPERDÍVEIS (E ESCONDIDOS) NA NETFLIX - PARTE 1

Já é quase clichê fazer listas de filmes escondidos no grande e variado catálogo da Netflix do Brasil, mas nunca é demais fuçar um pouco mais profundamente e descobrir obras que, por um motivo ou outro, podem ter passado em branco diante de tantas opções. Essa lista - dividida em duas partes - não se pretende definitiva ou tampouco imune a críticas ou questionamentos: é apenas (mais) um guia para quem pretende passar duas horas em frente à TV se divertindo sem precisar necessariamente desligar o cérebro.

01 - O ABUTRE (Nightcrawler, 2014) - Direção: Dan Gilroy



Jake Gyllenhaal está assustador nessa severa crítica à mídia sensacionalista, que concorreu ao Oscar de roteiro original e colocou o ator em várias listas de melhores do ano. Ele interpreta (de corpo e alma) um homem que, vivendo de vender imagens de desgraças à uma emissora de televisão, percebe que pode lucrar ainda mais quando começar a manipular as cenas que filma, ultrapassando o limite entre testemunha e participante. O diretor Dan Gilroy é irmão do também cineasta Tony (de "Conduta de risco", com George Clooney) e é casado com a estrela do filme, Rene Russo. Além do mais, o filme revelou o talento do ator Riz Ahmed, da ótima série "The night of".

02 - CAKE: UMA RAZÃO PARA VIVER (Cake, 2014) - Direção: Daniel Barnz



Os fãs da série "Friends" finalmente podem ver a extensão do talento dramático de Jennifer Aniston nesse filme um tanto carregado de melancolia e tristeza, mas dotado de um senso de poesia e de um final otimista que o impede de escorregar no sentimentalismo. Aniston, desprovida de qualquer glamour, interpreta uma mulher traumatizada de corpo e alma pela morte do filho pequeno que descobre uma nova esperança ao conhecer um jovem viúvo e seu filho - também carregando a dor da perda. Indicada ao Golden Globe de melhor atriz, Jennifer apresenta seu melhor momento no cinema até agora, mas que o público não espere nada de leve ou alto astral.

03 - UM CONTRATEMPO (Contratiempo, 2016) - Direção: Oriol Paulo



Um cineasta argentino de grande talento, Orion Paulo tem no currículo o surpreendente "O corpo", mas em "Um contratempo" ele vai ainda mais longe em seu esforço de pegar a plateia de surpresa a cada reviravolta do roteiro. O ótimo Mario Casas é o protagonista, um executivo bem-sucedido acusado de matar a amante e que conta com a ajuda de uma competente e experiente advogada para sair ileso do julgamento. Mais do que isso não convém falar: é uma surpresa atrás da outra, até o final impactante. Bom texto, direção segura e uma história envolvente. Imperdível! 

04 - DEMÔNIO (Devil, 2010) - Direção: John Erick Dowdle



Conhecido como o diretor de "O sexto sentido", que lhe deu fama e prestígio (além de um par de indicações ao Oscar), M. Night Shyamalan assina como produtor dessa pequena pérola do cinema de suspense. Ele é também o autor da estória de um grupo de pessoas que, presas dentro de um elevador, descobre que o demônio em pessoa está no meio deles. Tentar adivinhar qual deles é quem não diz ser - como nas melhores tramas da escritora inglesa Agatha Christie - é o grande gancho da trama, que não tem atores conhecidos no elenco, foi realizado com orçamento mínimo e mesmo assim é muito superior a grandes produções do gênero realizadas pelos estúdios hollywoodianos. Vale a pena descobrir!

05 - DOIS CARAS LEGAIS (The nice guys, 2016) - Direção: Shane Black


Talvez seja difícil imaginar Russell Crowe fazendo rir, mas é exatamente isso o que acontece nessa comédia de ação escrita e dirigida por Shane Black - o cara que de certa forma criou a estrutura básica dos filmes de ação holywoodianos dos anos 80, com "Máquina mortífera". Tudo bem que Crowe conta com a providencial ajuda de Ryan Gosling (um ator com ótimo timing cômico e uma versatilidade incomum), mas é injusto não reconhecer a forma como ele se reinventa na pele de um detetive particular que, em plena década de 70, tenta descobrir o paradeiro da filha de uma poderosa Kim Basinger. Piadas inteligentes, ritmo incessante e uma química impecável entre os protagonistas pontuam um filme despretensioso e que acaba por ser uma experiência das mais divertidas.

06 - ESCOBAR: PARAÍSO PERDIDO (Escobar: paradise lost, 2014) - Direção: Andrea Di Stefano



Personagem já comum no imaginário popular - também graças ao trabalho de Wagner Moura na série "Narcos" - o traficante colombiano Pablo Escobar ganha vida nas mãos do extraordinário Benicio Del Toro, mas aqui ele é apenas um coadjuvante. O protagonista é interpretado pelo jovem Josh Hutcherson (dos filmes "Jogos vorazes"), que mostra segurança e carisma na pele de um americano que, depois de casar-se com uma sobrinha de um homens mais poderosos do país, descobre que precisa ajustar-se a regras de lealdade e conduta que podem colocar-lhe em rota de colisão com seus princípios - e ameaçar sua vida. O diretor Andrea Di Stefano tem domínio narrativo e transforma os quarenta minutos de seu filme em um jogo de gato e rato de deixar a respiração suspensa. Um filme a ser descoberto.

07 - EX-MACHINA: INSTINTO ARTIFICIAL (Ex-machina, 2014) - Direção: Alex Garland



Autor do livro que deu origem ao filme "A praia", com Leonardo DiCaprio, o escritor Alex Garland conquistou uma indicação ao Oscar de melhor roteiro original por essa sua estreia na cadeira de diretor, que surpreendeu ao levar a estatueta de efeitos visuais contra "Star Wars: o despertar do Império". Na verdade, é uma ficção científica minimalista, que abdica de grandes cenas de ação para concentrar seu foco em um trio de protagonistas de tirar o fôlego: um jovem programador (Domhnall Gleeson), um recluso cientista (Oscar Isaac) e um robô feminino com inteligência artificial (Alicia Vikander) ficam confinados em uma propriedade afastada de tudo e passam a experimentar uma inédita forma de relacionamento entre humanos e androides. Surpreende e entretém na medida certa.

segunda-feira, 17 de abril de 2017

10 FILMES INCRÍVEIS BASEADOS EM LIVROS SENSACIONAIS


Uma das mais tradicionais queixas que leitores fazem quando assistem à uma adaptação de seus livros favoritos é a quase inevitável: "O livro é melhor que o filme!" Geralmente é, uma vez que em 300 páginas um autor pode aprofundar sua história e seus personagens de maneira que um roteiro de 120 dificilmente consegue - principalmente porque literatura é uma arte de palavras, enquanto cinema é fundamentalmente baseado em imagens (que nem sempre são capazes de apreender tudo que o criador das tramas imaginou). Porém, de vez em quando, os astros se alinham e um roteirista talentoso realiza o milagre de agradar tanto os fãs dos originais quanto os eventuais frequentadores de cinema - além de conquistar a crítica e alguns prêmios, como o ambicionado Oscar. A lista abaixo (totalmente criada a partir de critérios subjetivos e pessoais), faz um apanhado de alguns roteiros - dos anos 90 em diante - que fazem jus à seu material original pelas mais diversas razões. Aproveitem para assistir ao que ainda não assistiram e rever os que já tiveram o grande prazer de ver.


01. ALTA FIDELIDADE (High fidelity, 1999) - Livro de Nick Hornby. Direção de Stephen Frears.


A transposição da ação de Londres para Chicago é a maior (e praticamente única) alteração entre o romance de Nick Hornby e o roteiro, escrito por John Cusack (também astro do filme), Steve Pink, Scott Rosenberg e D.V. DeVincentis. O humor sagaz e recheado de cultura pop dos anos 80 se mantém intocado na história do dono de uma loja de vinis (vivido por Cusack em seu melhor momento no cinema) que resolver fazer um inventário de seus relacionamentos para tentar descobrir os motivos que o levam a jamais se comprometer de verdade com suas namoradas (até mesmo com aquela que verdadeiramente ama). Com uma trilha sonora deliciosa complementando diálogos inteligentes que mesclam melancolia e bom-humor, "Alta fidelidade" é um dos clássicos de sua época. Vale também conferir "Um grande garoto" (2003), do mesmo Nick Hornby e estrelado por Hugh Grant: é igualmente bem-sucedido em transferir para a tela a agradável prosa do autor britânico.


02. CLUBE DA LUTA (Fight club, 1999) - Livro de Chuck Palahniuk. Direção de David Fincher.


Um dos filmes mais polêmicos do final do século XX, a adaptação do anárquico romance de Chuck Palahniuk, feita por Jim Uhls, serviu como uma luva para aquele tipo de conservadorismo que adora ver o cinema como o responsável por tudo de ruim que acomete a sociedade. Não é pra menos: o filme de David Fincher não apenas evita disfarçar qualquer tipo de violência como também não poupa o público de discursos críticos e controversos sobre a vida contemporânea (condenando sem meias-palavras o capitalismo e o consumismo desenfreado). Dono de uma ironia tão ácida que poucos perceberam logo em sua estreia, o filme naufragou nas bilheterias mas virou cult com o tempo, assumindo seu papel de obra-prima (mais uma) na carreira do diretor e de seus dois astros, Edward Norton e Brad Pitt (com quem já havia trabalhado em "Seven: os sete crimes capitais" (95) e voltaria a dirigir em "O curioso caso de Benjamin Button", de 2008). Além de tudo, tem a melhor performance da carreira de Helena Bonham-Carter, uma edição matadora e uma cena final clássica, ao som Pixies. Imperdível!


03. DESEJO E REPARAÇÃO (Atonement, 2007) - Livro de Ian McEwan. Direção de Joe Wright.


Só quem leu alguma obra do britânico Ian McEwan para saber o tamanho da encrenca em que o roteirista Christopher Hampton se meteu quando aceitou adaptar sua obra-prima, "Reparação". Um romance centrado basicamente em sensações e pensamentos, o livro era um desafio gigantesco para qualquer um, mas Hampton já tinha um Oscar em casa (pela adaptação de "Ligações perigosas", do francês Choderlos de Laclos) quando aceitou o desafio. E saiu-se muito melhor que a encomenda. Um dos filmes mais subestimados de sua temporada (apesar da indicação ao Oscar principal, que perdeu para "Onde os fracos não tem vez", dos Irmãos Coen), "Desejo e reparação" é um avassalador estudo sobre o poder muitas vezes destruidor da imaginação, através de uma personagem central (Saoirse Ronan na adolescência, Romola Garai na fase adulta e Vanessa Redgrave na maturidade) tentando consertar um erro irreparável cometido em uma noite de verão às vésperas da I Guerra Mundial. Dirigido por Joe Wright (que já tinha no currículo "Orgulho e preconceito", baseado em Jane Austen e que tinha a mesma Keira Knightley no elenco), é um filme inesquecível que honra cada página do livro original. Uma pérola mais do que rara, valorizada pela atuação de James McAvoy.


04. GAROTA EXEMPLAR (Gone girl, 2014) - Livro de Gillian Flynn, Direção de David Fincher.


Olha David Fincher na lista outra vez. Com sua tendência em valorizar o suspense de cada cena e transformá-la em um espetáculo próprio, Fincher encontrou no romance policial de Gillian Flynn o material ideal para um dos maiores sucessos de bilheteria de sua carreira. Rosamund Pike concorreu ao Oscar de melhor atriz por seu desempenho como uma jovem desaparecida no dia de seu aniversário de casamento e que põe a polícia atrás de seu paradeiro, fazendo da vida de seu marido (Ben Affleck) um inferno na Terra. Seguindo a estrutura narrativa do livro (adaptado pela própria autora) e pegando o espectador pela tensão constante e pelas reviravoltas bem construídas, o filme é um perfeito exemplo de thriller policial e mais uma prova do imenso talento do diretor em contar QUALQUER história. E além do mais, é um estudo minucioso sobre o jogo de aparências que é um casamento. Genial!


05. AS HORAS (The hours, 2002) - Livro de Michael Cunningham. Direção de Stephen Daldry.


Três mulheres, três tempos narrativos, três épocas distintas e o sentimento de melancolia profunda que as une através de uma única obra literária: "Mrs. Dalloway", de Virginia Woolf. Se lendo já é complexo e denso, é de se imaginar como seria em uma tela de cinema. Missão impossível? Não para o diretor Stephen Daldry (indicado então ao Oscar, por "Billy Elliot") e o dramaturgo David Hare, que fizeram de "As horas", do norte-americano Michael Cunningham, um dos filmes mais poderosos e inquietantes dos últimos anos. A estrutura do romance manteve-se intacta no roteiro (indicado ao Oscar) e a edição magistral, unida à trilha sonora impecável de Philip Glass, fazem do resultado final um quadro brilhante de coesão e coerência psicológica. Nicole Kidman (premiada pela Academia) vive a própria Virginia Woolf, em crise de depressão, vivendo nos arredores de Londres e escrevendo, no começo dos anos 20, o livro que lhe daria fama. Na Los Angeles do final dos anos 40, a dona-de-casa Laura Brown (Julianne Moore), grávida do segundo filho, lê o romance de Woolf e identifica-se com a protagonista enquanto mergulha em um estado de tristeza profunda. E na Nova York do final do século XX, Clarissa Vaughan (Meryl Streep), que herdou o nome da heroína da história, vive um dia similar ao dela, preparando uma festa para um amigo e antigo amante, hoje em estágio terminal de AIDS (Ed Harris). Como as três histórias se entrelaçam é o pulo do gato do livro e do filme, que dividem o tom de extrema melancolia e absoluta sensibilidade. Uma obra-prima inquestionável!


06. LOS ANGELES: CIDADE PROIBIDA (LA Confidential, 1997) Livro de James Ellroy. Direção de Curtis Hanson


Ninguém podia imaginar que Curtis Hanson, o homem por trás de filmes de suspense apenas razoáveis, como "A mão que balança o berço" e "O rio selvagem", poderia assinar o melhor filme noir norte-americano desde os anos 40. Baseado em um caudaloso romance de James Ellroy que abarca décadas de narrativa e quase uma centena de personagens, o roteiro coescrito pelo diretor e por Brian Helgeland deu à trama concisão, foco e, mesmo com algumas alterações substanciais em histórias paralelas, o equilíbrio exato de inteligência e violência - além de escalar um elenco impecável (que revelou Russell Crowe e deu um Oscar à Kim Basinger) e mergulhar o espectador em um universo fascinante e imprevisível. Sem contar muito, pode-se dizer que a trama acompanha um grupo de policiais de Los Angeles da década de 50 em uma investigação sobre corrupção dentro da corporação e o assassinato de uma prostituta sósia de uma estrela de cinema. Melhor filme de 1997, teve o azar de bater de frente com "Titanic" na disputa pelo Oscar e ficou com apenas duas estatuetas: atriz coadjuvante para Basinger e roteiro adaptado. Merecia muito mais.


07. NOTAS SOBRE UM ESCÂNDALO (Notes on a scandal, 2006) - Livro de Zoe Heller. Direção de Richard Eyre.


Só o duelo de interpretações entre Judi Dench e Cate Blanchett (ambas indicadas ao Oscar pelo filme) já seria motivo mais do que suficiente para que o filme de Richard Eyre fosse recomendável. Mas, para tornar tudo ainda melhor, o roteiro do dramaturgo Patrick Marber (do sensacional "Closer: perto demais") e a direção claustrofóbica de Richard Eyre fazem de "Notas sobre um escândalo" um programa obrigatório. Dench interpreta uma professora quase aposentada e pouco amistosa que fica obcecada com a nova colega de trabalho (Blanchett, linda e talentosa como sempre) a ponto de praticamente viver em sua função. Quando ela descobre um romance proibido entre a amiga e um aluno adolescente, resolve aproveitar-se da situação para dominá-la completamente. Tornando o romance de Zoe Heller ainda melhor, o roteiro de Marber não ousa na estrutura ou força situações dramáticas: seus personagens falam por si, com uma força potencializada por suas extraordinárias intérpretes.


08. RAZÃO E SENSIBILIDADE (Sense and sensibility, 1995) - Livro de Jane Austen. Direção de Ang Lee


Um cineasta nascido na Taiwan do século XX dirigindo um filme baseado no romance de uma inglesa do século XVIII? Poderia virar um samba do crioulo doido, se tal cineasta não fosse Ang Lee - um dos mais sensíveis realizadores de sua época, autor de filmes brilhantes como "Banquete de casamento" (93), "Tempestade de gelo" (97) e "O segredo de Brokeback Mountain" (2005) - e a escritora não fosse Jane Austen, dona de um senso de humor e uma ironia que a destacava das demais romancistas de sua época. Com o roteiro fiel e igualmente sagaz da atriz Emma Thompson, "Razão e sensibilidade" acabou por tornar-se uma das mais perfeitas transições para o cinema da literatura de Austen - também autora de "Orgulho e preconceito" e "Emma". A própria Thompson vive uma das protagonistas, duas irmãs de personalidades opostas que buscam, no fundo, a mesma coisa: um bom casamento (leia-se um marido bem de vida e que lhes dê o amor que merecem). A irmã impetuosa é vivida por Kate Winslet pré-Titanic mas já dotada de grande talento: concorreu ao Oscar de coadjuvante. No elenco secundário encontra-se também Hugh Laurie, que se consagraria anos depois como o infame médico protagonista de "House". Um filme agradável e realizado com a inteligência que se espera de Ang Lee e Emma Thompson.


09. O SILÊNCIO DOS INOCENTES (The silence of the lambs, 1991) - Livro de Thomas Harris. Direção de Jonathan Demme.


O mais antigo da lista, que já pode ser considerado um clássico moderno. Adaptado com uma fidelidade quase literal do romance de Thomas Harris, "O silêncio dos inocentes" deu à Ted Tally o Oscar de roteiro - em um filme que também premiou seu diretor Jonathan Demme, seu ator Anthony Hopkins e sua atriz Jodie Foster, além de levar ainda o principal troféu da cerimônia de 1992. A história da angustiante relação entre uma jovem agente do FBI e um serial killer canibal é, sem dúvida, um dos filmes mais importantes e impactantes da década de 90, graças principalmente à capacidade de Tally em sublinhar o que havia de mais importante na prosa de Thomas Harris e enfatizar psicologicamente a ação de sua protagonista - elementos que a direção, a fotografia e a montagem conseguiram tornar ainda mais poderosos. Um filme que não envelheceu um único segundo desde sua estreia.


10. SOBRE MENINOS E LOBOS (Mystic River, 2003) - Livro de Dennis Lehane. Direção de Clint Eastwood.


Clint Eastwood tem fama de realizar seus filmes de forma rápida e eficiente. Isso fica claro em "Sobre meninos e lobos", adaptado do livro de Dennis Lehane - autor também das histórias de "Medo da verdade" (2008) e "Ilha do medo" (2010) - e estrelado por Sean Penn, Kevin Bacon e Tim Robbins: sua narrativa é direta, seca e quase cruel, apenas ocasionalmente apelando para metáforas que amenizam a violência física e psicológica que permeia todo o roteiro. A história acompanha o reencontro forçado de três amigos de infância quando um deles perde a filha, outro investiga seu assassinato e o terceiro, vítima de abuso sexual quando criança, surge como suspeito. Penn e Robbins levaram o Oscar pra casa, mas o filme merecia mais: é triste, é realista e não recorre jamais a soluções sentimentaloides ou inverossímeis. Um dos melhores trabalhos de Eastwood e uma adaptação (de Brian Helgeland, de "Los Angeles: cidade proibida") de tirar o chapéu.

sexta-feira, 14 de abril de 2017

FUNNY GIRL

No início dos anos 2000 não havia leitor antenado que não soubesse quem era Nick Hornby. Autor de romances bem-humorados que mesclavam personagens bem construídos com tramas repletas de referências pop contemporâneas, ele tornou-se um dos escritores mais cobiçados também pelos estúdios de cinema, que não demoraram para levar às telas, com sucesso, obras como "Alta fidelidade" (1999) e "Um grande garoto" (2002). Mudando de lado nesse processo cultural, ele passou também a adaptar livros alheios para versões cinematográficas - e chegou a ser indicado ao Oscar por "Educação" (2009). Seu livro mais recente, "Funny girl" (Ed. Companhia das Letras), ele volta seu olhar para o passado - mais precisamente a década de 60 - para prescrutar, com seu sarcasmo característico, os bastidores do entretenimento inglês no momento em que a contracultura e o movimento hippie começavam a transformar a sisuda cultura britânica. Apesar de não apresentar uma trama muito consistente, concentrando-se mais nos personagens do que na história, Hornby mais uma vez não decepciona: seu livro é, como sempre, uma leitura agradável e inteligente, para se ler com um sorriso nos lábios.

A protagonista do livro - uma personagem encantadora que poderia facilmente ter o rosto de Emma Stone em sua transposição para o cinema - é Barbara Parker, uma jovem ao mesmo tempo ambiciosa e ingênua que abandona sua cidade natal, no interior da Inglaterra, para tentar a sorte como atriz em Londres. Bela e talentosa, ela sonha em repetir os passos de seu maior ídolo, a comediante norte-americana Lucille Ball, e, como a sorte precisa estar no caminho dos principiantes, ela não demora a passar em um teste da BBC e ser escolhida como protagonista de uma sitcom chamada "Barbara (e Jim)" - com os parênteses no nome masculino como uma prova do tamanho de seu prestígio junto aos produtores. Com o nome artístico de Sophie Straw, ela dá início, então, a uma bem-sucedida carreira que lhe fará conhecer as entranhas dos programas de tevê e da cultura popular inglesa no geral. Por quatro temporadas, ela e sua equipe são acompanhadas pela prosa fluente e divertida de Hornby, que apresenta ao leitor uma gama de personagens fascinantes que compensam plenamente a fragilidade do enredo.

Além de Sophie - uma garota descobrindo aos poucos como funcionam as engrenagens da indústria do entretenimento e da vida adulta em uma grande cidade, repleta de tentações e radicalmente diferente de sua rotina no interior - o autor de "Funny girl" tem vários outros trunfos para seduzir o leitor. Através de sua protagonista, Hornby cria uma teia de personagens que retratam de forma mordaz e acurada a sociedade britânica da década que pariu os Beatles, os Rolling Stones, "Hair" e a geração flower power. Há Clive Richardson, o parceiro de Sophie na série, que considera uma ofensa pessoal o fato de ver seu personagem como escada para sua colega novata e não aceita com facilidade que seus dias de galã estão prestes a acabar (e que se envolve em um romance complicado com a parceira de programa). Há Dennis, o produtor que, mesmo casado (e traído pela esposa com um arrogante intelectual que despreza qualquer tipo de atividade cultural que não seja a dele), não consegue resistir ao carisma de Sophie. E há a dupla de roteiristas do programa, gays que lidam de maneiras diferentes com sua sexualidade em uma época em que poderiam ser presos por isso: Tony prefere esconder-se em um casamento heterossexual e formar uma família nos moldes convencionais, enquanto Bill, mais ousado e ambicioso, opta por utilizar seu estilo de vida como inspiração para um salto maior na carreira literária e se torna um importante escritor "maldito".

A cada um desses personagens Nick Hornby dedica preciosas e delicadas páginas de sua obra, que flui como uma narrativa simples e desprovida de intelectualidades ou pretensões maiores do que divertir o leitor. Apesar da queda de seu ritmo nos últimos capítulos - em que dá um salto no tempo para visitar os protagonistas em idade avançada e tentando reconquistar o sucesso há muito esquecido - o romance tem muito mais qualidades do que defeitos, comprovando que o tempo em que o autor passou escrevendo roteiros (é dele também a adaptação de "Livre", que deu à Reese Witherspoon uma indicação ao Oscar de melhor atriz em 2015) não lhe tirou o talento de contar histórias nas páginas de um livro, para alívio dos fãs, saudosos de sua prosa elegante e perspicaz. Que o próximo não demore tanto!

quarta-feira, 12 de abril de 2017

PRECISAMOS FALAR SOBRE: 13 REASONS WHY

Faça de conta que você tem novamente 16 anos de idade. Esqueça que você é formado em Psicologia ou Psiquiatria e que está nesse momento sentado sobre uma pilha de compêndios escritos muitas vezes por gente que domina a teoria mas está muito longe da prática e da convivência do objeto de seus estudos. Tente deixar de lado por um momento apenas a racionalidade analítica e cega. Tente lembrar que nem todo mundo que assiste a uma série de TV ou a um filme procura (ou até mesmo percebe) elementos de narrativa ou simbolismo que a sua experiência como espectador de décadas já localiza sem esforço. E principalmente, tente lembrar de como você se sentia na adolescência quando se olhava no espelho: se você não se sentia o dono do mundo - inatingível, incapaz de fracassar e irresistível aos olhos do sexo oposto - ou a pior pessoa a caminhar pelo planeta Terra - invisível, inadequada e vítima constante do deboche alheio - "13 reasons why" não foi feita para você. Sim, você pode assistí-la, comentá-la e até criticá-la - mas não é seu público-alvo e portanto, se alguém presta um desserviço à juventude que atravessa com dificuldade um dos momentos mais sensíveis da vida não são os produtores, roteiristas e diretores da série, e sim você.

É muito fácil (e conveniente) sair pela Internet vociferando condenações ao programa quando não se tem a noção do que é passar pelas situações vividas pela protagonista - ou não se lembra mais delas, ou acha que tudo é exagero ou drama desnecessário. Acusar de irresponsável um programa que trata com respeito de temas tão carentes de discussão na sociedade, como bullying, suicídio adolescente, machismo, abandono afetivo e a mais absoluta falta de empatia com as pessoas mais próximas soa, no mínimo, a vontade de chamar a atenção no embalo do sucesso e da repercussão da série. Dizer que ela romantiza o suicídio é uma falácia, assim como escorar-se nas recomendações das organizações que tratam do assunto: é difícil compreender que alguém possa achar romântico cortar os pulsos da maneira como mostrada na (forte mas necessária) cena que mostra o ato da personagem central, e qualquer psicólogo consciente sabe que discutir o assunto é imprescindível para que ele deixe de ser um perigoso tabu. Até mesmo o impressionante crescimento na procura de ajuda pelo CVV (Centro de Valorização da Vida) causado pela série é tratado com desprezo por vocês, detratores: "é o mínimo que se poderia esperar depois de uma campanha", bradam, provavelmente indignados com o fato de que, em apenas 13 episódios, o programa fez pela juventude o que 20 anos de "Malhação" nem chegou perto de fazer.

E é bizarro também notar a raiva que dedicam à série. Tudo é motivo para implicância, desde as atuações até o tom "juvenil demais". Mais uma vez é preciso lembrar um ponto essencial: o público-alvo de "13 reasons" não liga para coisas como roteiro, linguagem visual, metáforas e afins (ainda que, ouso dizer sem medo, tudo isso é muito bem feito em todos os episódios, ao contrário do que vocês afirmam): o que a audiência nota e sabe reconhecer é a mensagem que está diante de seus olhos. E diante de seus olhos está um retrato verdadeiro, dolorido, contundente e (por que não?) assustador de uma realidade com a qual eles lidam diariamente. A seu modo (com uma narrativa expandida em pílulas de tensão e suspense como uma boa série deve ser), o programa - baseado em um romance de Jay Asher publicado em 2007 - levanta um espelho para que a plateia consiga identificar-se e o mundo à sua volta. Se todos irão se reconhecer é outro papo, mas só em deixar explícito o que muita gente (educadores e familiares incluídos) prefere varrer para debaixo do tapete a série já merece aplausos. Se escolas não discutem o assunto, justamente um serviço de streaming, tão demonizado por certos setores da indústria do entretenimento, resolveu fazer: essa ousadia talvez tenha sido o gatilho de tanta revolta.


E por falar em gatilho: vocês afirmam, com uma certeza quase plena e absoluta, que os episódios finais, com seu tom de desesperança e tristeza, podem influenciar jovens em crise a cometerem suicídio. Ok, pessoas em depressão ou graves crises psicológicas realmente deveriam evitar o programa, mas por decisão de pais, professores e responsáveis e não por causa de seus conselhos - que ninguém pediu, aliás. Depressão é uma doença séria. Seríssima. Em casos extremos pode levar ao suicídio, sim. Mas, como afirmado, uma doença. Tratável, administrável e, dependendo da situação, curável. O que a série mostra, no entanto, não é um suicídio por depressão (ao menos não unicamente por causa dela): Hanna Baker, a protagonista, passa por uma série de situações que vão se acumulando até o nível do mais alto desespero, e até mesmo a mais saudável das criaturas talvez não aguentasse o rojão. Ela não tira a própria vida porque está doente - tudo vem em consequência de uma sucessão de acontecimentos que, banais ou grandiosos, destroem sua alma e sua esperança na vida. Considerar a decisão de Hanna como covardia ou drama sem necessidade é uma falta de respeito a todos aqueles que, por um motivo ou outro, não viram outra saída. Se vocês fazem parte desse time que acha que ela optou por um caminho mais fácil (se é que morrer da forma mostrada pode ser considerada algo fácil) então sinto informar-lhes que vocês provavelmente estariam nas fitas gravadas por ela. Falta de empatia e atenção com as pessoas à sua volta: esse é o verdadeiro e maioral tema da série caso não tenham percebido enquanto escreviam suas diatribes.

Já ouvi muitos casos de adolescentes que romperam a barreira com os pais a respeito dos temas propostos pelos roteiros: são jovens que finalmente perceberam que não estão sozinhos, que não estão jogados à própria sorte e que nunca é tarde para reverter atitudes e conceitos nocivos. Se isso é irresponsabilidade, então espero que muitas outras séries irresponsáveis surjam em breve, para que possamos discutir sem meias-palavras condutas odiosas como as mostradas no programa. E a vocês que insistem em chicotear "13 reasons why" porque ele teve a coragem de desnudar a aparente calma e tranquilidade da adolescência ao mostrar seu lado doentio e cruel, recomendo que desviem os olhos dos livros e façam o que ela pede: prestem atenção também ao que não está dito e explicado. Como já dizia Saint-Exupéry, "o essencial é invisível aos olhos". Não sejam uma razão! Não matem mais Hannahs Baker com sua falta de empatia. Vocês sobreviveram à adolescência. Deixem que outros também o façam.

segunda-feira, 10 de abril de 2017

DEZ GRANDES VIDEOCLIPES DIRIGIDOS POR CINEASTAS

Desde a década de 80 a indústria do videoclipe tornou-se uma espécie de tubo de ensaio para a carreira de vários cineastas, que flertaram com o formato - consagrado por nomes como Michael Jackson e Madonna - antes de embarcarem em projetos mais ambiciosos em Hollywood. Alguns fizeram o percurso inverso e já eram grandes cineastas quando conquistaram a geração MTV, emissora responsável por tornar o que era apenas veículo de divulgação para cantores e bandas em pequenas obras de arte, frequentemente melhores que muitos filmes de orçamento milionário e conteúdo nulo. Deixando de lado os vídeos da banda sueca ABBA - cujas canções sempre tinham ilustração visual graças ao futuro indicado ao Oscar Lasse Halstrom (de "Minha vida de cachorro" e "Regras da vida") - faço uma lista (pessoal) de dez grandes videoclipes dirigidos por gente de cinema. E que realmente parecem parte da sétima arte.

01. BAD (1987) - Michael Jackson - Dirigido por Martin Scorsese


Martin Scorsese estava em vias de embarcar na difícil produção de "A última tentação de Cristo" quando aceitou o desafio de comandar Michael Jackson e suas estripulias musicais em um video de 18 minutos com claras referências ao clássico "Amor, sublime amor", vencedor do Oscar de 1961. Jackson, já no topo graças ao sucesso de "Thriller" (também dirigido por um cineasta, John Landis, e considerado um divisor de águas na história do videoclipe), divide a cena com o ator Wesley Snipes, que substituiu Prince, que faria um dueto com Michael. Um video que já nasceu antológico.

02. BAD ROMANCE (2009) - Lady Gaga - Dirigido por Francis Lawrence


Francis Lawrence não tem o mesmo respeito e prestígio que Martin Scorsese, mas seu currículo inclui alguns sucessos incontestáveis de bilheteria, como "Constantine" (2005) e os três capítulos finais da cinessérie "Jogos vorazes". Já experiente em vídeos musicais - trabalhando com Britney Spears ("I'm a slave 4 u"), Green Day ("Warning") e Jennifer Lopez ("Waiting for tonight" e "Play") - Lawrence encontrou nas excentricidades de Lady Gaga um terreno fértil para a criação de um pequeno espetáculo de visual impressionante e coreografias que consagraram uma das mais talentosas artistas populares a surgir no século XXI. Perfeito casamento entre imagens e som, "Bad romance" é um dos melhores vídeos de Gaga, e o que talvez melhor represente sua importância no atual panorama da música pop.

03. ALL THE WAY TO RENO (YOU'RE GONNA BE A STAR) (2001) - R.E.M. - Dirigido por Michael Moore


O mais popular documentarista dos EUA Michael Moore também já fez sua parte no trabalho de unir música e cinema. Com sua experiência em registrar a verdade através de suas câmeras - que lhe dariam fama por filmes essenciais como "Tiros em Columbine" (2002) e "Fahrenheit 11 de setembro" (2004) - ele contou com a ajuda de seis alunos secundaristas de uma típica escola americana para filmarem suas rotinas enquanto a bela canção da banda de Michael Stipe serve como comentário às ambições da juventude. Em comparação com alguns outros trabalhos da banda (como "Imitation of life") é de uma simplicidade tocante. E um belo videoclipe.

04. ENJOY THE SILENCE (1990) - Depeche Mode - Dirigido por Anton Corbijn


Uma das bandas essenciais dos anos 90, Depeche Mode encontrou no holandês Anton Corbijn o comandante perfeito para a tradução em imagens de uma de suas mais icônicas canções, "Enjoy the silence", do álbum "Violator". Antes de dedicar-se ao cinema em poucos e caprichados filmes - dentre os quais o melancólico "Control", sobre a vida do roqueiro Ian Curtis, vocalista da banda Joy Division, que suicidou-se às vésperas do sucesso mundial - Corbijn já estava na estrada há alguns anos, trabalhando com U2 ("One", "Electrical storm"), Roxette ("Stars", "Salvation"), Nirvana ("Heart-shaped box"), Metallica ("Mamma said", Hero of the day") e Coldplay ("Talk"). Sempre cuidadoso com o visual de seu trabalho, o diretor levou a banda de David Gahan para filmar em Portugal, na Espanha e na Suíça - o que resultou em um vídeo clássico e imortal.


05. HELLO (2015) - Adele - Dirigido por Xavier Dolan


Menino-prodígio do cinema canadense, Xavier Dolan dirigiu seu primeiro e elogiado filme ("Eu matei a minha mãe") com apenas 20 anos de idade e desde então vem colecionando tanto elogios quanto críticas graças a seu estilo pouco dado a meio-termos. Escolhido pela britânica Adele para dirigir seu retorno às paradas de sucesso com a arrasadora "Hello", ele não fez por menos: com uma estupenda fotografia em preto-e-branco e uma paisagem das mais inspiradoras, ele assinou um vídeo elegante, clássico e que demonstra a maturidade do jovem realizador, que este ano saiu do Cesar (o Oscar francês) com a estatueta de melhor diretor pelo filme "É apenas o fim do mundo".

06. ELA DISSE ADEUS (1998) - Os Paralamas do Sucesso - Dirigido por Andrucha Waddington


Tem brasileiro na lista, sim, senhor. Utilizando-se de elementos clássicos do expressionismo alemão em uma paródia brilhante estrelada por Fernanda Torres - uma das mais expressivas atrizes nacionais e por coincidência mulher do diretor do clipe - Andrucha Waddington assinou um dos mais premiados videoclipes brasileiros da década de 90. Cineasta com alguns títulos ótimos ("Gêmeas", "Eu, tu, eles") e outros nem tanto ("Os penetras") no currículo, Andrucha merece lugar de honra na seleção, por conseguir casar técnica, humor e inteligência à música já deliciosa dos Paralamas do Sucesso. Obs: no Youtube o título da música está errado. Que mancada!!

07. LOSING MY RELIGION (1991) - R.E.M. - Dirigido por Tarsem Singh


Mais um R.E.M. da lista, e dessa vez com um clássico absoluto dos anos 90, tão repleto de significados e símbolos cruzados que é difícil resumir em poucas linhas (aos interessados, um pouco mais sobre isso em http://nerdgeekfeelings.com/simbologia-de-losing-my-religion-do-rem/). Dirigido pelo indiano Tarsem Singh - que não se deu tão bem assim no cinema, assinando apenas obras medianas, como "A cela" (2000) e "Espelho, espelho meu" (2012) - e ilustrando uma das mais poderosas músicas sobre a perda da fé e da esperança, "Losing my religion" é a canção definitiva da banda de Michael Stipe e sua tradução visual é inesquecível e desconcertante. Um casamento perfeito de som e fúria.

08. WEAPON OF CHOICE (2001) - Fatboy Slim - Dirigido por Spike Jonze



Só mesmo quem não conhece a obra cinematográfica de Spike Jonze - "Quero ser John Malkovich" (1999) e "Adaptação" (2002) estão entre seus filmes sempre extremamente ligados a elementos surreais - pode estranhar a versão para a telinha de "Weapon of choice", estrelada pelo também esquisitão Christopher Walken. A música de Fatboy Slim nunca casou tão bem com imagens (e isso que Jonze também comandou o vídeo de "Praise you") e Walken poucas vezes pareceu tão à vontade em cena, dançando como se não houvesse amanhã e transformando pouco menos de quatro minutos em diversão pura e simples. Quem nunca assistiu faça esse favor a si mesmo!

09. LIKE A ROLLING STONE (1995) - The Rolling Stones - Dirigido por Michel Gondry


A antológica canção de Bob Dylan finalmente encontrou a voz de Mick Jagger em 1995 e resultou em um videoclipe dos mais celebrados da época. Estrelado pela agora oscarizada Patricia Arquette e dirigido por Michel Gondry - de "Brilho eterno de uma mente sem lembranças" - o vídeo é a união perfeita entre boa música e um grande trabalho visual, com efeitos simples e eficazes que dão uma perfeita sensação de desorientação. Um dos mais incríveis vídeos dos dinossauros do rock.

10. VOGUE (1990) - Madonna - Dirigido por David Fincher


Ninguém pensou que um post sobre videoclipes não teria Madonna, pensou? A rainha da mídia reinou absoluta nos anos 90 com uma obra de arte atrás da outra, sempre dirigida por gente da mais extrema competência e criatividade. Um dos seus mais felizes encontros foi com David Fincher, com quem fez três vídeos: "Oh, father", "Express yourself" e o mais genial de todos, "Vogue", que ditou tendências e alegrou as pistas de dança pelo mundo afora por muito tempo. Logo em seguida Fincher iria para Hollywood e assinaria obras-primas como "Seven" (1995), "Clube da luta" (1999), "Zodíaco" (2007), "O curioso caso de Benjamin Button" (2008), "A rede social" (2009) e "Garota exemplar" (2014). Antes disso, porém, inscreveu seu nome na lista dos mais bem-sucedidos e de bom-gosto diretor de videoclipes, com trabalhos como "Freedom '90", de George Michael, "Janie's got a gun", do Aerosmith e "Cradle of love", de Billy Idol. Quem tem talento tem em qualquer época e lugar.